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8 de junho de 2020

Aplicação prática da Supremacia da Administração Pública

*Por Victor Leal

INTRODUÇÃO

 
O presente trabalho trata do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado e sua aplicabilidade prática no âmbito da Administração Pública. Para entender o referido tema, é imprescindível compreender o Regime Jurídico da Administração Pública.

Em dissertação anterior definiu-se o Estado como o núcleo social, politicamente organizado e ordenado, com um poder soberano, exercido em um território, com um povo, para o cumprimento de finalidades específicas, por intermédio das suas funções essenciais, quais sejam, legislativa, judicial e executiva, todas em obediência à Lei Maior.

Nesse mesmo sentido, concluiu-se que o Estado, através da Administração Pública, exerce suas funções para atender aos interesses da coletividade, também chamados pela Doutrina de Interesses Públicos.

Estudou-se os princípios da Administração Pública, previstos expressamente no art. 37 da CF/1998, para que fosse possível compreender que, definitivamente, o Estado existe para amparar os interesses públicos, e não aos interesses particulares, seja de quem governa, seja de qualquer outra pessoa.

Neste estudo, faz-se indispensável a compreensão do Regime Jurídico da Administração Pública, para depois entender a aplicabilidade do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado.

DESENVOLVIMENTO

Por Regime Jurídico pode-se entender o conjunto de normas pré-existentes que regem e se aplicam com exclusividade a um caso concreto, afastando a incidência de outras normas, ainda que aparentemente mais favoráveis. Há dois campos de regras jurídicas. Primeiro o Privado, regido pela liberdade negocial e autonomia da vontade, em que os direitos e obrigações são, em regra disponíveis, sendo definidos, basicamente, pelo Código Civil e pela vontade das partes envolvidas, desde que não contrariem a lei (latu sensu).

Segundo o Público, em que impera a obrigação de cumprimento da lei, independente da autonomia da vontade. Os direitos e obrigações são em regra indisponíveis. São regidos pela Constituição e seus complementos. Este regime é marcado pela legalidade como balizadora da atuação administrativa.

O Regime Jurídico Administrativo, portanto, é a especial forma de agir conferida somente à Administração Pública.

Para a doutrina esse regime é baseado em 2 (dois) princípios, quais sejam, Indisponibilidade do Interesse Público e Supremacia do Interesse Público sobre o Privado.

O Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público obriga o administrador a, necessariamente, atuar nos limites da lei. Por exemplo, quando o Administrador Público pretende comprar computadores para a entidade que dirige, não poderá ele, segundo suas preferências, escolher qual será a empresa fornecedora, afinal a licitação é obrigatória, ou seja, é interesse público qualificado, indisponível. Também é classificado como um Poder-Dever, de modo que a Administração não pode se afastar do interesse público. Este princípio é uma forma de controle do Estado.

Para Éder, em artigo publicado no sítio eletrônico “Central de Favoritos  <

Regime jurídico-administrativo: Conceito, Princípios expressos e implícitos da Administração Pública
A indisponibilidade do interesse público contrabalanceia a supremacia do interesse público”.

O princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado, objeto deste estudo, é um verdadeiro pilar de sustentação de toda a atividade administrativa. É que, para solucionar os mais variados conflitos entre interesses públicos e particulares, a Administração necessita valer-se de prerrogativas para impor a vontade da coletividade.

Para Maria Silvia Zanella Di Pietro:

…o princípio da supremacia do interesse público está presente tanto no momento de elaboração da lei como no momento de execução em concreto pela Administração Pública. Dessa forma, o princípio serve para inspirar o legislador, que deve considerar a predominância do interesse público sobre o privado na hora de editar normas de caráter geral e abstrato.

Diversos são os exemplos práticos da aplicação da Supremacia do Interesse Público, porém, atendo-se ao objeto deste trabalhos, três serão citados a seguir.

O primeiro diz respeito aos atributos dos atos administrativos, como a presunção de veracidade, legitimidade e imperatividade. Ora, numa hipotética contenda entre um particular e o Estado, em que o agente de trânsito anotou uma multa por afirmar ter visto o particular falando ao telefone, certamente o particular estará em clara desvantagem, pois, em que pese relativa a presunção, os atos e declarações da Administração Pública, são considerados verídicos.

O segundo refere-se às cláusulas exorbitantes nos contratos administrativos, que permitem, por exemplo, a alteração ou rescisão unilateral do contrato. Como exemplo, imagine-se que a administração licitou e contratou o fornecimento de 100 (cem) sacos de cimento de determinada empresa. Em tese, ela seria obrigada apenas a entregar aquela quantidade. Entretanto, valendo-se de sua posição de supremacia, com base no art. 65, §1º, o contratado é obrigado a aceitar acréscimos ou reduções de até 25% do valor contratado. Senão veja-se:

Art. 65.  Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

[…] § 1o  O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinqüenta por cento) para os seus acréscimos.

O terceiro e derradeiro exemplo, diz respeito ao poder de polícia administrativa, que impõe condicionamentos e limitações ao exercício da atividade privada, buscando preservar o interesse geral. Exemplo corriqueiro é o do cidadão comum que pretende dar uma festa em sua casa, com sonorização no local. A rigor, ouvir som eu sua propriedade é absolutamente legítimo ao particular, porém, os seus vizinhos também possuem direito de um ambiente sonoro despoluído. Ao haver uma colisão entre esses dois interesses, um privado e um público, a Administração, através da polícia administrativa, irá restringir o uso do som, seja limitando o seu volume, seja apreendendo o equipamento, sem prejuízo da aplicação de multa e outras sanções administrativas.

CONCLUSÃO

Portanto, tendo em vista que a Administração tutela interesses da coletividade, faz-se necessário muni-la de prerrogativas, atributos e poderes, que a coloquem em posição de supremacia sobre interesses eminentemente privados e dissonantes do bem comum. Vale alertar, finalmente, que o interesse público imposto pela Administração jamais pode ser confundido com os interesses dos gestores que, momentaneamente, exercem funções públicas.

Victor Leal

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Central de Favoritos, Disponível em: https://centraldefavoritos.com.br/2018/07/09/regime-juridico-administrativo-conceito-principios-expressos-e-implicitos-da-administracao-publica/.  Acesso em: 26 mar. 2020.

PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 19ª edição. Editora Atlas. São Paulo, 2006, pag. 64.

CARVALHO, Raquel Melo Urbano de. Curso de Direito Administrativo. Editora Jus Podivrm. Salvador, 2008, pag. 71-72.